Isto não é verdade. A Pirâmide da Aprendizagem é falsa.

Eu sempre vi esta pirâmide da aprendizagem ou cone da aprendizagem apresentando estes números tão redondos e tão claros dizendo que ao ouvirmos uma palestra a gente aprende apenas 5% do seu conteúdo. De uma leitura nós conseguimos reter 10%. Quando alguém nos ensina algo com recursos audio-visuais aprendemos 20%. Por meio de uma demonstração prática conseguimos apreender 30% do conteúdo ensinado. Uma discussão em grupo nos dá 50% de aproveitamento. Praticando o conhecimento absorvemos 75%. E ensinando aos outros conseguimos fixar 90% do conteúdo estudado.

Eu sempre achei isso lindo. Mas eu precisava da fonte, do estudo, dos resultados originais. E fui à caça. Digo… fui pesquisar. E nada. Não encontrei nenhuma fonte segura a respeito dos dados dessa pirâmide tão famosa.

Há centenas de milhares de imagens como essas na internet.

Comprei o livro do William Glasser, a quem se atribui a autoria da pirâmide. E não encontrei nada. Também encontrei que a pirâmide é atribuída a um tal de Edgard Dale. E há muitas indicações mostrando que a pesquisa fora feita pelo NTL Institute – National Training Laboratories Institute.

Mas eu nunca consegui encontrar os estudos originais.

E eu sei da importância de se fazer isso pois eu já vi muitos resultados de pesquisas sérias sendo difundidas pela internet de forma completamente distorcida e prejudicando estudantes que confiam nas informações divulgadas por portais educacionais que só fazem reproduzir e traduzir artigos de divulgação e vulgarização científica sem analisarem de perto os resultados alcançados.

Finalmente eu encontrei dois artigos de autores que pesquisaram mais do que eu e chegaram à mesma conclusão: Esta pirâmide é falsa. Não há registros dos estudos originais que tenham alcançado estes resultados tão redondos e simétricos.

Aqui você tem dois links para os dois artigos que questionam a autoria do texto.

Artigo 1 – Pirâmides e cones de aprendizagem: da abstração à hierarquização de estratégias de aprendizagem

Autores: Fábio Luiz da Silva – Doutor em História. Professor do Programa de Pós-Graduação em Metodologias para o Ensino de Linguagens e suas Tecnologias da Universidade Norte do Paraná, Londrina, PR – Brasil
fls.londrina@yahoo.com.br e Fabiane Tais Muzardo Doutora em História. Professora do Curso de Licenciatura em História da Universidade Norte do Paraná, Londrina, PR – Brasil – biumuzardo@yahoo.com.br

Resumo do Artigo 1 – As pirâmides e cones de aprendizagem são recursos costumeiramente utilizados no meio escolar para defender que as práticas pedagógicas que favorecem a participação mais ativa dos alunos são as mais eficientes. Na maioria das vezes, essas pirâmides e cones são associadas aos estudos de William Glasser e Edgar Dale. Esses pesquisadores, contudo, não criaram uma hierarquia de estratégias mais eficientes, muito menos associaram tais estratégias a porcentagem de sucesso ou insucesso na aprendizagem. Em algum momento essa associação foi realizada e transformou-se, com o tempo, em argumento de autoridade. Tendo em vista essa realidade, o objetivo desse artigo é discutir os usos desses sólidos da aprendizagem, tidos, muitas vezes, como referências para praticas pedagógicas de sucesso.

Artigo 2 (Inglês) – A rebuttal of NTL Institute’s learning pyramid http

Autor: KÅRE LETRUD – Lillehammer University College – This article discusses the learning pyramid propagated by National Training Laboratories Institute.

Seria necessário que para que este estudo fosse realizado nós tivéssemos, por exemplo, a quantidade de pessoas que participaram do estudo. Precisaríamos saber a idade das pessoas, se elas possuem a mesma capacidade de apreensão, qual a formação escolar de cada uma delas. Elas deveriam ser submetidas a canais diversos de aprendizagem, e em cada canal deveria ser transmitido o mesmo conteúdo. Além disso nenhuma delas poderia ter conhecimento prévio sobre o conhecimento transmitido durante os testes. Os pesquisadores deveriam ter em mente que reapresentação por um segundo canal já estaria impactada pela apresentação prévia do conteúdo pelo primeiro canal. Enfim, os testes necessários para alcançar estes resultados seriam muito complexos.

Além disso tudo, aquilo que você pode aprender de uma leitura ou de uma palestra depende do quanto você já sabe daquele assunto. Se eu tenho um bom domínio sobre futebol e vou ler um artigo sobre futebol eu aprenderei mais lendo sobre futebol do que assistindo uma palestra sobre xadrez a respeito do qual eu não sei nada. E o enxadrista, certamente vai aprender muito mais facilmente qualquer coisa a respeito de xadrez do que qualquer coisa a respeito do futebol. O conhecimento prévio que temos a respeito de assuntos de nosso interesse impacta profundamente na forma como aprendemos coisas novas.

E que nós aprendamos mais ensinando, isto não só é óbvio, mas exige que antes de ensinar nós leiamos, que nós assistamos a algumas aulas, tenhamos alguma experiência sobre o assunto. Então é impossível comparar estas atividades indicadas na pirâmide considerando que a última atividade (ensinar) necessita das anteriores (leituras, aulas e experiências).

Também não faz sentido nenhum confiar nos números da pirâmide de aprendizagem sem saber se os conteúdos testados eram conteúdos linguísticos, matemáticos, visuais, sonoros. Não faz sentido, assumir que tais dados possam ser confiáveis, se não soubermos a faixa etária das pessoas testadas.

O mais grave de tudo é que instâncias decisórias de escolas e universidades tomem como base certas informações que não possuem base científica nenhuma.

Por um lado, no que diz respeito ao uso da pirâmide de aprendizagem, o mais importante é que os artigos acima sejam encontrados e lidos, pois eles são mais precisos e mais pontuais na crítica às pirâmides de aprendizagem que nós encontramos espalhadas pela internet e que muitas vezes ilustram as paredes de nossas escolas.

Se queremos que nossas crianças e nossos jovens estudantes aprendam com mais eficácia, e ao longo de toda sua vida, uma das coisas mais importantes que deveríamos fazer, ao longo de toda a formação escolar e mesmo acadêmica, seria torná-los protagonistas do seu processo de aprendizagem, ensinando-lhes estratégias de auto regulação da aprendizagem e fazendo com que, gradualmente, eles mesmos se tornem capazes de identificar o que mais lhes ajuda a aprender.